Trabalho apresentado a Professora Ms. Leila Carla Flohr, da disciplina de Andragogia - Pós Graduação
ESTUDO DE CASO
“Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.”
Fernando Pessoa
Todos os homens, todos os seres, todas as coisas existentes devem provar as emoções, saborear cada ato e cada sensação para se sentir pleno.
O homem em sua plenitude deve ser o protagonista de sua história, organizando seu mundo e transformando outros mundos. Cada homem permeia esse caminho através dos conhecimentos adquiridos, alguns recebidos na escola, instituição, outros recebidos na vida.
A escola tem o papel fundamental na construção de vida do homem, pois deve ter uma prática de educação transformadora, emancipatória e humanizadora, voltada para a realidade concreta da comunidade, seus objetivos e anseios, denunciando todas as formas de opressão e de degradação da dignidade humana, e, elevando a criação e a recriação da sociedade e do mundo.
Porém, a escola exclui as diferenças, deixando a margem de seus “muros e mundos” um cinturão de analfabetos “letrados e iletrados” desmotivados, que servirão de massa de mão-de-obra para os modernos “senhores” donos das grandes empresas.
É função do poder público, por meio da escola, resgatar essas pessoas marginalizadas por meio de sua autoestima e propiciar uma educação de qualidade, para que esta possa progredir financeiramente e intelectualmente, tornando-se um agente eficaz de transformação.
“ (...) Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva, porque capaz de amar. (...)” Paulo Freire.
Portanto, quando se trata do desenvolvimento cognitivo de um adulto, temos que levar em consideração a realidade em que ele vive, a razão pela qual está buscando conhecimento, a sua capacidade, e qual o motivo que o levou a frequentar uma sala de aula.
Cabe ao professor a motivação desse aluno, desenvolvendo assuntos para que ele possa transformar situações do seu cotidiano.
Normalmente o diálogo leva facilmente esse aluno a expor experiências vividas em seu trabalho, viagens, família e convivência social. O professor busca orientar esse diálogo e leva-lo a escolher ou a se interessar por algo que ele queira aprender, de acordo com suas necessidades, a sua maturidade de vida.
“ (...) Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidade para a sua própria produção ou a sua construção (...)” Paulo Freire.
A vida do aluno é o centro de todo o seu saber, levar esse a dividir essas experiências de vida ajuda-o no desenvolvimento cognitivo e estimula sua vontade de estar buscando novos conhecimentos.
Esses conhecimentos normalmente vem para a sala de aula através de sua oralidade. Muitos não possuem a escrita, mas são ricos na oralidade.
Como a permanência na educação ainda é um privilégio de poucos, uma quantidade gigantesca ainda permanece a margem do domínio de uma norma culta para a escrita. Afinal se formos acreditar no mito de uma língua única, existem milhões de pessoas neste país que não tem acesso a essa língua. Claro que também falam o português, mas não o padrão, tem sua gramática particular, que, no entanto não reconhecida como válida, que é desprestigiada, ridicularizada, alvo de chacota, por parte dos falantes da gramática padrão.
“ ... todas as escolas e demais instituições voltadas para a educação abandonem esse mito de ‘unidade’ do Português no Brasil e passem a reconhecer a verdadeira diversidade linguística de nosso país para melhor planejarem suas políticas de ação junto à população amplamente marginalizada dos falantes das variantes não padrão...” Marcos Bagno.
É dever da escola resgatar a linguagem desse aluno e “ propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se...” (Freire), ou seja, construir juntos o conhecimento.
Segundo o conceito de adulto defendido por Oliveira: “...adulto é um indivíduo maduro suficiente para assumir as suas responsabilidades por seus atos diante da sociedade...”
Então utilizando os quatro aspectos que o autor considera para traçar um conceito mais completo e objetivo da capacidade humana: sociológico, biológico, psicológico e jurídico, analisaremos um aluno característico da EJA (Educação de Jovens e Adultos).
Em consideração: 1) a capacidade sociológica: é independente e responsável, demonstra isso chegando no horário, comparecendo com freqüência nas aulas, trabalhando de motorista de caminhão. Tem carro próprio, motivo que o levou a procurar a EJA (tirar a habilitação; 2) a capacidade biológica: ele é considerado potencialmente reprodutivo, é casado, tem dois filhos, logo é capaz de perpetuar a espécie; 3) a capacidade psicológica: demonstra uma certa dependência, demonstrando insegurança na aprendizagem. Tem dificuldades em assimilar o conteúdo mesmo que este seja transferido paralelamente com sua realidade. Não consegue usar de suas experiências para somar conhecimento; 4) a capacidade jurídica: trata-se de uma pessoa aparentemente apta para responder por seus atos e também tem bom comportamento em ambiente social. Não demonstra agressividade ou rigidez em suas atividades.
Por ser uma pessoa que tem grande dificuldade na escrita e na leitura, faz-se necessário um estudo dirigido. Toda produção textual é um vai-e-vem entre aluno e professor, até que fique relativamente satisfatória. Isso se dá também, pelo motivo de a leitura ser relativamente ruim.
“Escritor competente é aquele que adquiriu satisfatoriamente o código escrito e que, além disso, desenvolveu processos eficientes na composição do texto” Cassany
Portanto, o aluno está no processo, já que :” ... podemos reconhecer pessoas que falam como um livro e também pessoas que escrevem como falam...” Cassany. Se o meio onde aluno está propiciasse uma linguagem mais culta, certamente o seu desenvolvimento seria melhor.
Consequentemente, é indispensável a este aluno possibilitar muitas habilidade na construção textual: discriminar as informações relevantes das irrelevantes, estrutura-las numa ordem cronológica e compreensível, escolher palavras adequadas, ligar frases entre si, constituir parágrafos, até chegar a um texto coeso e coerente. Para isso é necessário trabalhar paralelamente:
1- as experiências do aluno, que segundo Freire, devem ser valorizadas;
2- a correção do professor, realizada durante o processo.
Ensinar assim, é certamente, mais difícil do que distribuir rótulos de certo ou errado para o nosso aluno, mas é mais justo e democrático.
BAGNO, Marcos. Português ou Brasileiro? – um convite a pesquisa. São Paulo: Parábola, 2001
BAGNO, Marcos, Preconceito Lingüístico - o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2001
CASSANY, Daniel. Descrever o escrever: como se aprende a escrever. Itajaí: UNIVALI, 1999
DE NICOLA, José. Fernando Pessoa. São Paulo: Scipione, 1995
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paulinas, 1986